REDE - Associação de Estruturas Para a Dança Contemporânea

19-06-2018 Posição da REDE sobre os Programas de Apoio a Projetos 2018-2019

POSIÇÃO DA REDE - ASSOCIAÇÃO DE ESTRUTURAS PARA A DANÇA CONTEMPORÂNEA

SOBRE OS PROGRAMAS DE APOIO A PROJETOS 2018-2019

1. Os projetos artísticos independentes de caráter pontual desempenham um papel insubstituível na renovação, dinamização e reforço do tecido artístico nacional, ao mesmo tempo que possibilitam a continuidade do trabalho de artistas e estruturas que, face às limitações da realidade económica da última década, têm vindo a desenvolver o seu trabalho fora do âmbito dos programas de caráter sustentado.

1.1. Neste contexto, os programas de apoio a projetos são ferramentas essenciais do desenvolvimento da importante atividade artística independente que decorre em paralelo à já integrada nos programas de apoio sustentado às artes.

2. Na sequência da abertura dos Programas de Apoio a Projetos “Simplificado” e de Apoio a Projetos de “Criação”, “Programação e Desenvolvimento de Públicos” e “Circulação e Desenvolvimento de Públicos”, a REDE solicita uma clarificação de questões e a adoção de medidas de correção, associadas à aplicação desta modalidade de apoio, que considera urgentes, nomeadamente as relacionadas com a:

2.1. redução da dotação orçamental disponível;

2.2. redução do número de candidaturas a apoiar;

2.3. subdivisão nos domínios específicos apresentados a concurso;

2.4. distribuição da dotação orçamental pelos programas e domínios apresentados a concurso e, dentro dos mesmos, pelos diferentes patamares;

2.5. preocupa-nos, ainda, o encaminhamento para estes concursos das estruturas que não foram contempladas com Apoio Sustentado, confundindo e desvirtuando a missão das distintas modalidades de apoio.

3. Após análise comparativa com a aplicação do Programa de Apoio Pontual 2017-2018, no contexto do Anterior Modelo de Apoio às Artes verificou a REDE o seguinte:

3.1. Em 2017 o procedimento concursal aos Apoios Pontuais às Artes apoiou um total de 40 projetos de “criação”, com uma dotação orçamental disponível de 910.000€, e 15 projetos de “programação” com uma dotação orçamental disponível de 450.000€, totalizando um apoio a 55 projetos pontuais com a verba de 1.360.000€, de entre um universo de cerca de 280 candidatos nacionais que procuraram estes apoios.

3.2. Em 2018, no contexto da aplicação do Novo Modelo de Apoio às Artes, abriram as candidaturas para os Apoios a Projetos que contam com um apoio de 700.000€ para 24 projetos de “criação” e um apoio de 400.000€ para 13 projetos de “programação e desenvolvimento de públicos”, perfazendo um total de 37 projetos apoiados com um total de 1.100.000€. Ou seja, uma redução significativa, quer no montante disponível (menos 260.000€), quer no número de projetos a apoiar nestes domínios (18 projetos), com incidência no apoio à “criação”, que abrange menos 16 projetos que o concurso anterior.

3.3. Relativamente ao apoio a projetos nos domínios da “circulação nacional e desenvolvimento de públicos”, foi criado um novo concurso dotado de 300.000€ para projetos balizados entre os 5.000€ e os 20.000€, embora apenas contemple determinadas despesas (deslocações, alojamento, seguros específicos, etc.) e exclua outras (despesas com cachets, per diems ou ajudas de custo, aquisição de equipamentos, etc.), fator que devia ser revisto, à semelhança do concurso à Internacionalização, outro dos domínio de apoio do programa que abriu em março com 220.000€ para projetos entre 6.000€ e 30.000€, ainda em decisão e à espera de segunda fase, embora sem que se conheça a verba a disponibilizar e se existirão patamares.

3.3.1. Neste domínio - “circulação nacional e desenvolvimento de públicos” - alerta-se para a necessidade de articular o investimento com a responsabilidade das entidades públicas e privadas de programação (rede de teatros e cineteatros nacionais e municipais, redes de programação formais e informais, entidades apoiadas no apoio sustentado ou em projetos de programação, entre outras), para que não se redobre o apoio estatal e não se substituam vocações. E também se alerta, novamente, para as questões estratégicas sobre a internacionalização que a REDE apontou atempadamente nas suas propostas orientadas para a conceção de um Novo Modelo de Apoio às Artes.

3.4. Deixa ainda de haver um apoio mais substancial à edição, um domínio de apoio relativamente recente, quando os concursos do ano de 2017 contemplaram 16 projetos pontuais com montantes entre os 5.000 e os 10.000€, totalizando 120.000€ de apoio.

3.4.1 Para este domínio resta apenas a possibilidade de aceder a apoio através do “procedimento simplificado”, onde se encontra disponível um montante financeiro inferior por projeto.

3.5. Apesar de aparentemente o valor médio do montante disponível por projeto ser mais elevado, isso só acontece com prejuízo da redução do número de projetos a apoiar por domínio e do desaparecimento de patamares com valores inferiores aos agora disponíveis, que são mais adequados a projetos de pequena dimensão e à oferta de oportunidades para a renovação do tecido artístico (e.g. patamar de 10.000€).

3.6. Em simultâneo encontram-se a decorrer candidaturas ao Programa de Apoio Procedimento Simplificado, cujo montante por candidatura pode oscilar entre os 400€ e os 4.000€.

3.6.1. Embora a definição destes limites orçamentais possam fazer sentido para o investimento em projetos muito específicos e de pequena escala, não conseguem substituir projetos que tipicamente estariam enquadrados num patamar de 10.000€.

3.6.2. Cumprindo o objetivo de desburocratizar a atribuição de apoios a projetos com orçamento reduzido, não se compreende por que razão o Programa de Apoio a Projetos Procedimento Simplificado não possibilita aceder a todos os domínios artísticos, uma vez que pelo seu caráter e limite orçamental não substitui diretamente nenhum dos outros programas a concurso.

3.6.2.1. Mas, também, não se compreende a necessidade de existirem procedimentos diferentes para idênticos domínios de apoio neste programa, pelo que se sugere revisão da distribuição global dos Apoios a Projetos.

3.6.2.2. Verifica-se ainda que para, um efeito muito semelhante, i.e., o apoio a projetos independentes de pequena e média dimensão, existem nos domínios da “Circulação Nacional” e “Internacionalização” um procedimento sem júri e outro com júri, o que nos faz questionar a pertinência desta divisão.

3.6.3. Entre outras questões, o modo como o apoio a projetos “Procedimento Simplificado” está a ser distribuído necessita de uma clarificação, análise, reflexão e revisão, visto que apesar de estar prevista a sua abertura em permanência até setembro de 2018, em início de junho já foi esgotada, pela segunda vez em 2018, a totalidade da dotação orçamental para este apoio, frustrando as expectativas dos que se pretendiam candidatar noutro momento do prazo estabelecido.

3.7. Apesar da importância destes apoios (Projetos), apenas 2.100.000€ estão destinados ao total dos apoios a projetos, em contraste com os cerca de 19.000.000€ com que contou o Programa aos Apoios Sustentados que, mesmo assim, se revelou um valor muito insuficiente para assegurar as necessidades do que resta de uma comunidade artística já fragilizada pelos inúmeros cortes a que tem sido continuamente sujeita nos últimos anos.

3.8. Alerta-se, novamente, para o facto dos Apoios a Projetos, de natureza e objetivos distintos dos Apoios Sustentados, nunca poderem servir para colmatar lacunas da aplicação do concurso a esses apoios, sobretudo após um corte orçamental tão evidente no financiamento ao Apoio a Projetos.

3.8.1. Recorde-se que em 2017 menos de metade das candidaturas aos Apoios Pontuais consideradas elegíveis foram contempladas com apoio, o que demonstra a já insuficiente capacidade de dar resposta às necessidades do setor.

4. Considerando o supra exposto, a REDE solicita a máxima atenção de V.as Ex.as para as seguintes questões:

4.1. Atualmente, quando praticamente todos os programas de apoio às artes, promovidos pela Direção-Geral das Artes, foram já lançados, exceto o Programa de Apoio em Parceria, é possível ter uma melhor visão transversal deste Novo Modelo de Apoio, repensar a sua adequação à realidade cultural existente e prever o que poderá ser a atividade artística nacional, no âmbito de uma estratégia de política cultural clara, corajosa, sustentada, sustentável e devidamente articulada com a auscultação realizada aos agentes culturais, para um futuro que contrarie o desinvestimento até agora constatado.

4.1.1. É igualmente importante que haja melhor definição do que é o programa de apoio em parceria antes da sua execução, para o qual ainda está destinada a verba de 500 000€, e refletir sobre a necessidade de abrir esta linha de apoio numa altura em que urge fortalecer o Programa de Apoio a Projetos.

4.2. Como se a mesma não fosse absolutamente essencial ao desenvolvimento do país, cada vez mais a não existência dessa política cultural coloca em risco a diversidade e riqueza da liberdade de pensamento, discursos e práticas nas artes - contrariando o defendido na Constituição Portuguesa.

4.3. É crucial que essa estratégia seja atempada e publicamente comunicada, ao invés de apenas deixar uma margem de reação muito condicionada, a uma realidade já determinada aquando da disponibilização das ferramentas operacionais dos diferentes programas de apoio.

4.4. Considerando algumas das inegáveis qualidades demonstradas pelo setor artístico português, como a persistência e a resiliência, sobretudo perante as condições adversas a que, prolongadamente, tem estado exposto nos últimos anos, urge recompensá-lo através de um investimento que dignifique o seu trabalho e o desenvolvimento artístico de todo o território nacional.

4.5. Compreende-se, assim, que os apoios à criação nunca deverão ser diminuídos, pois são a base da atividade de desenvolvimento artístico nacional.

4.5.1. Não se concebe um país de mais de 10 milhões de habitantes com apenas 24 projetos independentes de criação artística de curta duração apoiados pelo Estado, pois isso caracteriza um país de desinvestimento na formação e investigação artísticas e que declaradamente convida à emigração das novas gerações de artistas, comprometendo o seu futuro.

4.6. O desinvestimento na criação independente reduz drasticamente o potencial de desenvolvimento de todos os domínios artísticos, com especial impacto negativo nos projetos de pequena e média dimensão, tipicamente da autoria de artistas mais jovens e emergentes, com dificuldade em aceder a patamares elevados de financiamento.

4.7. É, portanto, fundamental e urgente um verdadeiro reforço da dotação orçamental e do número de candidaturas a apoiar neste concurso, que retome, no mínimo, os valores do concurso do ano anterior, com efeito imediato, acompanhado de uma revisão refletida do formato dos respetivos programas de Apoio a Projetos, não só como medida de correção das consequências da aplicação do Novo Modelo de Apoio às Artes como para impulsionar uma realidade cultural plural, inclusiva e enriquecida pela diversidade de gerações, modos de produção, linguagens, tipos de pesquisa e experimentação que caracterizam a comunidade artística portuguesa.